I - RELATÓRIO
Introdução
A nação brasileira através de suas instituições, e no âmbito de
seus entes federativos vem assumindo, vigorosamente, responsabilidades
crescentes para que a Educação Básica, demanda primeira das sociedades
democráticas, seja prioridade nacional como garantia inalienável do
exercício da cidadania plena.
A conquista da cidadania plena, fruto de direitos e deveres
reconhecidos na Constituição Federal depende, portanto, da Educação
Básica, constituída pela Educação Infantil, Fundamental e Média, como
exposto em seu Artigo 6º.
Assim, a Educação Fundamental, segunda etapa da Educação Básica,
além de co-participar desta dinâmica é indispensável para a nação. E o é
de tal maneira que o direito a ela, do qual todos são titulares
(direito subjetivo), é um dever, um dever de Estado (direito público).
Daí porque o Poder Público é investido de autoridade para impô-la como
obrigatória a todos e a cada um.
Por isto o indivíduo não pode renunciar a este serviço e o poder
público que o ignore será responsabilizado, segundo o art. 208, §2º da
CF.
A magnitude da importância da Educação é assim reconhecida por
envolver todas as dimensões do ser humano: o singulus, o civis, o socius
ou seja, a pessoa em suas relações individuais,
civis e sociais.
O exercício do direito à Educação Fundamental supõe, também todo o exposto no
art. 3º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, no qual os princípios da igualdade, da liberdade, do
reconhecimento do pluralismo de idéias e concepções pedagógicas, da
convivência entre instituições públicas e privadas estão consagrados.
Ainda neste art. 3º, as bases para que estes princípios se realizem
estão estabelecidas na proposição da valorização dos professores e da
gestão democrática do ensino público com garantia de padrão de
qualidade.
Ao valorizar a experiência extra-escolar dos alunos e propor a
vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais, a
LDB é consequente com os arts. 205 e 206 da Constituição Federal, que
baseiam o fim maior da educação no pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho.
Nestas perspectivas, tanto a Educação Infantil, da qual trata a
LDB, arts. 29 a 31, quanto a Educação Especial, arts. 58 a 60, devem
ser consideradas no âmbito da definição das Diretrizes Curriculares
Nacionais, guardadas as especificidades de seus campos de ação e as
exigências impostas pela natureza de sua ação pedagógica.
Um dos aspectos mais marcantes da nova LDB é o de reafirmar, na
prática, o caráter de República Federativa, por colaboração.
Desta forma, a flexibilidade na aplicação de seus princípios e
bases, de acordo com a diversidade de contextos regionais, está presente
no corpo da lei, pressupondo, no entanto, intensa e profunda ação dos
sistemas em nível Federal, Estadual e Municipal para que, de forma
solidária e integrada possam executar uma política educacional coerente
com a demanda e os direitos de alunos e professores.
Antecedentes das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental
O art. 9º, inciso IV, da LDB assinala ser incumbência da União:...
"estabelecer, em colaboração com os Estados, Distrito Federal e os
Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino
fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e os seus
conteúdos mínimos, de modo a assegurar a formação básica comum".
Logo, os currículos e seus conteúdos mínimos (art. 210 da CF/88),
propostos pelo MEC (art. 9º da LDB), terão seu norte estabelecido
através de diretrizes. Estas terão como foro de deliberação a Câmara de
Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (art. 9º, § 1º, alínea
"c" da Lei nº 9.131, de 24 de novembro de 1995).
Dentro da opção cooperativa que marcou o federalismo no Brasil,
após a Constituição de 1988, a proposição das diretrizes será feita em
colaboração com os outros entes federativos (LDB, art. 9º).
Ora, a federação brasileira, baseada na noção de colaboração,
supõe um trabalho conjunto no interior do qual os parceiros buscam, pelo
consenso, pelo respeito aos campos específicos de atribuições, tanto
metas comuns como os meios mais adequados para as finalidades maiores da
Educação Nacional. Esta noção implica, então, o despojamento de
respostas e caminhos previamente prontos e fechados, responsabilizando
as Secretarias e os Conselhos Estaduais do Distrito Federal e Municipais
de Educação, pela definição de prazos e procedimentos que favoreçam a
transição de políticas educacionais ainda vigentes, encaminhando
mudanças e aperfeiçoamentos, respaldados na Lei 9394/96, de forma a não
provocar rupturas e retrocessos, mas a construir caminhos que propiciem
uma travessia fecunda.
Desta forma, cabe à Câmara de Educação Básica do CNE exercer a sua
função deliberativa sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais,
reservando-se aos entes federativos e às próprias unidades escolares, de
acordo com a Constituição Federal e a LDB, a tarefa que lhes compete em
termos de implementações curriculares.
Tal compromisso da Câmara pressupõe, portanto, que suas "funções
normativas e de supervisão" (Lei
9131/1995), apóiem o princípio da definição de Diretrizes
Curriculares Nacionais, reconhecendo a flexibilidade na articulação
entre União, Distrito Federal, Estados e Municípios como um dos
principais mecanismos da nova LDB. No entanto, a flexibilidade por ela
propiciada não pode ser reduzida a um instrumento de ocultação da
precariedade ainda existente em muitos segmentos dos sistemas
educacionais. Assim flexibilidade e descentralização de ações devem ser
sinônimos de responsabilidades compartilhadas em todos os níveis.
Ao definir as Diretrizes Curriculares Nacionais, a Câmara de
Educação Básica do CNE inicia o processo de articulação com Estados e
Municípios, através de suas próprias propostas curriculares, definindo
ainda um paradigma curricular para o Ensino Fundamental, que integra a
Base Nacional Comum, complementada por uma Parte Diversificada (LDB,
art. 26), a ser concretizada na proposta pedagógica de cada unidade
escolar do País.
Em bem lançado Parecer do ilustre Conselheiro Ulysses de Oliveira
Panisset, o de nº 05/97 da CEB, aprovado em 07/05/97 e homologado no DOU
de 16/95/97, é explicitada a importância atribuída às escolas dos
sistemas do ensino brasileiro, quando, a partir de suas próprias
propostas pedagógicas, definem seus calendários e formas de
funcionamento, e, por conseqüência, seus regimentos tal como disposto na
LDB, arts. 23 a 28.
As propostas pedagógicas e os regimentos das unidades escolares
devem, no entanto, observar as Diretrizes Curriculares Nacionais e os
demais dispositivos legais.
Desta forma, ao definir suas propostas pedagógicas e seus
regimentos, as escolas estarão compartilhando princípios de
responsabilidade, num contexto de flexibilidade teórico/metodológica de
ações pedagógicas, em que o planejamento, o desenvolvimento e a
avaliação dos processos educacionais revelem sua qualidade e respeito à
equidade de direitos e deveres de alunos e professores.
Ao elaborar e iniciar a divulgação dos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN), o Ministério da Educação propõe um norteamento
educacional às escolas brasileiras, "a fim de garantir que, respeitadas
as diversidades culturais, regionais, étnicas, religiosas e políticas
que atravessam uma sociedade múltipla, estratificada e complexa, a
educação possa atuar, decisivamente, no processo de construção da
cidadania, tendo como meta o ideal de uma crescente igualdade de
direitos entre os cidadãos, baseado nos princípios democráticos. Essa
igualdade implica necessariamente o acesso à totalidade dos bens
públicos, entre os quais o conjunto dos conhecimentos socialmente
relevantes".
Entretanto, se os Parâmetros Curriculares Nacionais podem
funcionar como elemento catalisador de ações, na busca de uma melhoria
da qualidade da educação, de modo algum pretendem resolver todos os
problemas que afetam a qualidade do ensino e da aprendizagem. "A busca
da qualidade impõe a necessidade de investimentos em diferentes frentes,
como a formação inicial e continuada de professores, uma política de
salários dignos e plano de carreira, a qualidade do livro didático,
recursos televisivos e de multimídia, a disponibilidade de materiais
didáticos. Mas esta qualificação almejada implica colocar, também, no
centro do debate, as atividades escolares de ensino e aprendizagem e a
questão curricular como de inegável importância para a política
educacional da nação brasileira." (PCN, Volume 1, Introdução, pp.13/14).
Além disso, ao instituir e implementar um Sistema de Avaliação da
Educação Básica, o MEC cria um instrumento importante na busca pela
eqüidade, para o sistema escolar brasileiro, o que deverá assegurar a
melhoria de condições para o trabalho de educar com êxito, nos sistemas
escolarizados. A análise destes resultados deve permitir aos Conselhos e
Secretarias de Educação a formulação e o aperfeiçoamento de orientações
para a melhoria da qualidade do ensino.
A proposta de avaliação nacional, deve propiciar uma correlação
direta entre a Base Nacional Comum para a educação, e a verificação
externa do desempenho, pela qualidade do trabalho de alunos e
professores, conforme regula a LDB, Art. 9º.
Os esforços conjuntos e articulados de avaliação dos sistemas de
educação, Federal, Estaduais, Municipais e do Distrito Federal
propiciarão condições para o aperfeiçoamento e o êxito da Educação
Fundamental.
Isto acontecerá na medida em que as propostas pedagógicas das
escolas reflitam o projeto de sociedade local, regional e nacional, que
se deseja, definido por cada equipe docente, em colaboração com os
usuários e outros membros da sociedade, que participem dos
Conselhos/Escola/Comunidade e Grêmios Estudantis.
A elaboração deste Parecer, preparatório à Resolução sobre as
Diretrizes Curriculares Nacionais, é fruto do trabalho compartilhado
pelos Conselheiros da Câmara de Educação Básica, e, em particular do
conjunto de proposições doutrinárias, extraídas dos textos elaborados,
especialmente, pelos Conselheiros Carlos Roberto Jamil Cury, Edla
Soares, João Monlevade e Regina de Assis.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental
Diretrizes Curriculares Nacionais são o conjunto de definições
doutrinárias sobre princípios, fundamentos e procedimentos na Educação
Básica, expressas pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de
Educação, que orientarão as escolas brasileiras dos sistemas de ensino,
na organização, na articulação, no desenvolvimento e na avaliação de
suas propostas pedagógicas.
Para orientar as práticas educacionais em nosso país, respeitando
as variedades curriculares já existentes em Estados e Municípios, ou em
processo de elaboração, a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional
de Educação estabelece as seguintes Diretrizes Curriculares para o
Ensino Fundamental:
I - As escolas deverão estabelecer, como norteadores
de suas ações pedagógicas:
a) os Princípios Éticos da Autonomia, da Responsabilidade, da
Solidariedade e do Respeito ao Bem Comum;
b) os Princípios Políticos dos Direitos e Deveres de Cidadania, do
exercício da Criticidade e do respeito à Ordem Democrática;
c) os Princípios Estéticos da Sensibilidade, da Criatividade, e da
Diversidade de Manifestações Artísticas e Culturais.
Estes princípios deverão fundamentar as práticas pedagógicas das
escolas, pois será através da Autonomia, da Responsabilidade, da
Solidariedade e do Respeito ao Bem Comum, que a Ética fará parte da vida
cidadã dos alunos.
Da mesma forma os Direitos e Deveres de Cidadania e o Respeito à
Ordem Democrática, ao orientarem as práticas pedagógicas, introduzirão
cada aluno na vida em sociedade, que busca a justiça, a igualdade, a
equidade e a felicidade para o indivíduo e para todos. O exercício da
Criticidade estimulará a dúvida construtiva, a análise de padrões em que
direitos e deveres devam ser considerados, na formulação de
julgamentos.
Viver na sociedade brasileira é fundamentar as práticas
pedagógicas, a partir dos Princípios Estéticos da Sensibilidade, que
reconhece nuances e variações no comportamento humano. Assim como da
Criatividade, que estimula a curiosidade, o espírito inventivo, a
disciplina para a pesquisa e o registro de experiências e descobertas.
E, também, da Diversidade de Manifestações Artísticas e Culturais,
reconhecendo a imensa riqueza da nação brasileira em seus modos próprios
de ser, agir e expressar-se.
II - Ao definir suas propostas pedagógicas, as escolas deverão explicitar
o reconhecimento da identidade pessoal de alunos, professores e
outros profissionais e a identidade de cada unidade escolar e de
seus respectivos sistemas de ensino.
O reconhecimento de identidades pessoais é uma diretriz para a
Educação Nacional, no sentido do reconhecimento das diversidades e
peculiaridades básicas relativas ao gênero masculino e feminino, às
variedades étnicas, de faixa etária e regionais e às variações
sócio/econômicas, culturais e de condições psicológicas e físicas,
presentes nos alunos de nosso país. Pesquisas têm apontado para
discriminações e exclusões em múltiplos contextos e no interior das
escolas, devidas ao racismo, ao sexismo e a preconceitos originados
pelas situações sócio-econômicas, regionais, culturais e étnicas. Estas
situações inaceitáveis têm deixado graves marcas em nossa população
infantil e adolescente, trazendo conseqüências destrutivas. Reverter
este quadro é um dos aspectos mais relevantes desta diretriz.
Estas variedades refletem-se, ainda, na própria Identidade das
escolas e sua relação com as comunidades às quais servem. Assim, desde
concepções arquitetônicas, história da escola, algumas vezes centenária,
até questões relacionadas com calendário escolar e atividades
curriculares e extra-curriculares, a diretriz nacional deve reconhecer
essas identidades e suas conseqüências na vida escolar, garantidos os
direitos e deveres prescritos legalmente. Neste sentido, as propostas
pedagógicas e os regimentos escolares devem acolher, com autonomia e
senso de justiça, o princípio da identidade pessoal e coletiva de
professores, alunos e outros profissionais da escola, como definidor de
formas de consciência democrática. Portanto, a proposta pedagógica de
cada unidade escolar, ao contemplar seja os Parâmetros Curriculares
Nacionais, seja outras propostas curriculares, deverá articular o
paradigma curricular proposto na Quarta Diretriz ao projeto de sociedade
que se deseja instituir e transformar, a partir do reconhecimento das
identidades pessoais e coletivas do universo considerado.
III - As escolas deverão reconhecer que as aprendizagens são
constituídas na interação entre os processos de conhecimento, linguagem
e afetivos, como conseqüência das relações entre as distintas
identidades dos vários participantes do contexto escolarizado, através
de ações inter e intra-subjetivas; as diversas experiências de vida dos
alunos, professores e demais participantes do ambiente escolar,
expressas através de múltiplas formas de diálogo, devem contribuir para
a constituição de identidades afirmativas, persistentes e capazes de
protagonizar ações solidárias e autônomas de
constituição de conhecimentos e valores indispensáveis à vida cidadã.
As evidências de pesquisas e estudos nas áreas de Psicologia,
Antropologia, Sociologia e
Lingüística, entre outras Ciências Humanas e Sociais, indicam a
necessidade imperiosa de se considerar, no processo educacional, a
indissociável relação entre conhecimentos, linguagem e afetos, como
constituinte dos atos de ensinar e aprender. Esta relação essencial,
expressa através de múltiplas formas de diálogo, é o fundamento do ato
de educar, concretizado nas relações entre as gerações, seja entre os
próprios alunos ou entre eles e seus professores. Desta forma os
diálogos expressos através de múltiplas linguagens verbais e não
verbais, refletem diferentes identidades, capazes de interagir consigo
próprias e com as demais, através da comunicação de suas percepções,
impressões, dúvidas, opiniões e capacidades de entender e interpretar a
ciência, as tecnologias, as artes e os valores éticos, políticos e
estéticos.
Grande parte do mau desempenho dos alunos, agravado pelos
problemas da reprovação e da preparação insatisfatória, prévia e em
serviço, dos professores, é devida à insuficiência de diálogos e
metodologia de trabalhos diversificados na sala de aula, que permitam a
expressão de níveis diferenciados de compreensão, de conhecimentos e de
valores éticos, políticos e estéticos. Através de múltiplas interações
entre professores/alunos, alunos/alunos, alunos/livros, vídeos,
materiais didáticos e a mídia, desenvolvem-se ações inter e
intra-subjetivas, que geram conhecimentos e valores transformadores e
permanentes. Neste caso, a diretriz nacional proposta, prevê a
sensibilização dos sistemas educacionais para reconhecer e acolher a
riqueza da diversidade humana desta nação, valorizando o diálogo em suas
múltiplas manifestações, como forma efetiva de educar, de ensinar e
aprender com êxito, através dos sentidos e significados expressos pelas
múltiplas vozes, nos ambientes escolares.
Por isso ao planejar suas propostas pedagógicas, seja a partir dos
PCN seja a partir de outras propostas curriculares, os professores e
equipes docentes, em cada escola, buscarão as correlações entre os
conteúdos das áreas de conhecimento e o universo de valores e modos de
vida de seus alunos.
Atenção especial deve ser adotada, ainda, nesta Diretriz, para
evitar que as propostas pedagógicas sejam reducionistas ou excludentes,
levando aos excessos da "escola pobre para os pobres", ou dos grupos
étnicos e religiosos apenas para si. Ao trabalhar a relação inseparável
entre conhecimento, linguagem e afetos, as equipes docentes deverão ter a
sensibilidade de integrar estes aspectos do comportamento humano,
discutindo-os e comparando-os numa atitude crítica, construtiva e
solidária, dentro da perspectiva e da riqueza da diversidade da grande
nação brasileira, como previsto no art. 3º, inciso I, da LDB.
Neste ponto seria esclarecedor explicitar alguns conceitos, para melhor compreensão do que propomos:
a) Currículo: atualmente este conceito envolve outros três, quais
sejam: currículo formal (planos e propostas pedagógicas), currículo em
ação (aquilo que efetivamente acontece nas salas de aula e nas escolas),
currículo oculto (o não dito, aquilo que tanto alunos, quanto
professores trazem, carregado de sentidos próprios criando as formas de
relacionamento, poder e convivência nas salas de aula). Neste texto
quando nos referimos a um paradigma curricular estamos nos referindo a
uma forma de organizar princípios Éticos, Políticos e Estéticos que
fundamentam a articulação entre Áreas de Conhecimentos e aspectos da
Vida Cidadã.
b) Base Nacional Comum: refere-se ao conjunto de conteúdos mínimos
das Áreas de Conhecimento articulados aos aspectos da Vida Cidadã de
acordo com o art. 26. Por ser a dimensão obrigatória dos
currículos nacionais - certamente âmbito privilegiado da avaliação
nacional do rendimento escolar - a Base Nacional Comum deve preponderar
substancialmente sobre a dimensão diversificada.
É certo que o art. 15 indica um modo de se fazer a travessia, em
vista da autonomia responsável dos estabelecimentos escolares. A
autonomia, como objetivo de uma escola consolidada, saberá resumir em
sua proposta pedagógica (art. 12 da LDB) a integração da Base Nacional
Comum e da Parte Diversificada, face às finalidades da Educação
Fundamental.
c) Parte Diversificada: envolve os conteúdos complementares,
escolhidos por cada sistema de ensino e estabelecimentos escolares,
integrados à Base Nacional Comum, de acordo com as características
regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela,
refletindo-se, portanto, na Proposta Pedagógica de cada Escola,
conforme o art. 26.
d) Conteúdos Mínimos das Áreas de Conhecimento: refere-se às noções
e conceitos essenciais sobre fenômenos, processos, sistemas e
operações, que contribuem para a constituição de saberes, conhecimentos,
valores e práticas sociais indispensáveis ao exercício de uma vida de
cidadania plena.
Ao utilizar os conteúdos mínimos, já divulgados inicialmente pelos
Parâmetros Curriculares Nacionais, a serem ensinados em cada área de
conhecimento, é indispensável considerar, para cada segmento (Educação
Infantil, 1ª. à 4ª. e 5ª. a 8ª. séries), ou ciclos, que aspectos serão
contemplados na intercessão entre as áreas e aspectos relevantes da
cidadania, tomando-se em conta a identidade da escola e seus alunos,
professores e outros profissionais que aí trabalham.
O espaço destas intercessões é justamente o de criação e recriação
de cada escola, com suas equipes pedagógicas, a cada ano de trabalho.
Assim, a Base Nacional Comum será contemplada em sua integridade, e
complementada e enriquecida pela Parte Diversificada, contextualizará o
ensino em cada situação existente nas escolas brasileiras. Reiteramos
que a LDB prevê a possibilidade de ampliação dos dias e horas de aula,
de acordo com as possibilidades e necessidades das escolas e sistemas.
Embora os Parâmetros Curriculares propostos e encaminhados às
escolas pelo MEC sejam Nacionais, não têm, no entanto, caráter
obrigatório, respeitando o princípio federativo de colaboração nacional.
De todo modo, cabe à União, através do próprio MEC o estabelecimento de
conteúdos mínimos para a chamada Base Nacional Comum (LDB, art. 9º).
IV - Em todas as escolas, deverá ser garantida a igualdade de
acesso dos alunos a uma Base Nacional Comum, de maneira a legitimar a
unidade e a qualidade da ação pedagógica na diversidade nacional; a Base
Nacional Comum e sua Parte Diversificada deverão integrar-se em torno
do paradigma curricular, que visa estabelecer a relação entre a
Educação Fundamental com:
a) a Vida Cidadã, através da articulação entre vários dos seus aspectos
como:
1. a Saúde;
2. a Sexualidade;
3. a Vida Familiar e Social;
4. o Meio Ambiente;
5. o Trabalho;
6. a Ciência e a Tecnologia;
7. a Cultura;
8. as Linguagens; com,
b) as Áreas de Conhecimento de:
1. Língua Portuguesa;
2. Língua Materna (para populações indígenas e migrantes);
3. Matemática;
4. Ciências;
5. Geografia;
6. História;
7. Língua Estrangeira;
8. Educação Artística;
9. Educação Física;
10. Educação Religiosa (na forma do art. 33 da LDB).
Assim, esta articulação permitirá que a Base Nacional Comum e a
Parte Diversificada atendam ao direito de alunos e professores terem
acesso a conteúdos mínimos de conhecimentos e valores, facilitando,
desta forma, a organização, o desenvolvimento e a avaliação das
propostas pedagógicas das escolas, como estabelecido nos arts. 23 a 28 ,
32 e 33, da LDB.
A
Educação Religiosa, nos termos da Lei, é uma disciplina obrigatória de
matrícula facultativa no sistema público (art. 33 da LDB).
Considerando que as finalidades e objetivos dos níveis e
modalidades de educação e de ensino da Educação Básica são, segundo o
Art. 22 da LDB:
· desenvolver o educando;
· assegurar-lhe a formação comum indispensável ao exercício da cidadania;
· fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores.
E, considerando, ainda, que o Ensino Fundamental, ( art. 32), visa à formação básica do cidadão mediante:
. o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios
básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo;
. a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político,
da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a
sociedade, desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, do
fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade
humana e de tolerância, situados no horizonte da igualdade, mais se
justifica o paradigma curricular apresentado para as Diretrizes
Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental.
A construção da Base Nacional Comum passa pela constituição dos
saberes integrados à ciência e à tecnologia, criados pela inteligência
humana. Por mais instituinte e ousado, o saber terminará por fundar uma
tradição, por criar uma referência. A nossa relação com o instituído não
deve ser, portanto, de querer destruí-lo ou cristalizá-lo. Sem um olhar
sobre o instituído, criamos lacunas, desfiguramos memórias e
identidades, perdemos vínculo com a nossa história, quebramos os
espelhos que desenham nossas formas. A modernidade, por mais crítica que
tenha sido da tradição, arquitetou-se a partir de referências e
paradigmas seculares. A relação com o passado deve ser cultivada, desde
que se exerça uma compreensão do tempo como algo dinâmico, mas não
simplesmente linear e seqüencial. A articulação do instituído com o
instituinte possibilita a ampliação dos saberes, sem retirá-los da sua
historicidade e, no caso do Brasil, de interação entre nossas diversas
etnias, com as raízes africanas, indígenas, européias e orientais.
A produção e a constituição do conhecimento, no processo de
aprendizagem, dá muitas vezes, a ilusão de que podemos seguir sozinhos
com o saber que acumulamos. A natureza coletiva do conhecimento termina
sendo ocultada ou dissimulada, negando-se o fazer social. Nada mais
significativo e importante, para a construção da cidadania, do que a
compreensão de que a cultura não existiria sem a socialização das
conquistas humanas. O sujeito anônimo é, na verdade, o grande artesão
dos tecidos da história. Além disso, a existência dos saberes associados
aos conhecimentos científicos e tecnológicos nos ajuda a caminhar pelos
percursos da história, mas sua existência não significa que o real é
esgotável e transparente.
Por outro lado, costuma-se reduzir a produção e a constituição do
conhecimento no processo de aprendizagem, à dimensão de uma razão
objetiva, desvalorizando-se outros tipos de experiências ou mesmo
expressões outras da sensibilidade.
Assim, o modelo que despreza as possibilidades afetivas, lúdicas e
estéticas de entender o mundo tornou-se hegemônico, submergindo no
utilitarismo que transforma tudo em mercadoria. Em nome da velocidade e
do tipo de mercadoria, criaram-se critérios para eleger valores que
devem ser aceitos como indispensáveis para o desenvolvimento da
sociedade. O ponto de encontro tem sido a acumulação e não a reflexão e a
interação, visando à transformação da vida, para melhor. O núcleo da
aprendizagem terminaria sendo apenas a criação de rituais de passagem e
de hierarquia, contrapondo-se, inclusive, à concepção abrangente de
educação explicitada nos arts. 205 e 206, da CF.
No caso, pode-se, também, recorrer ao estabelecido no art. 1º, da
LDB quando reconhece a importância dos processos formativos
desenvolvidos nos movimentos sociais, nos organismos da sociedade civil e
nas manifestações culturais, apontando, portanto, para uma concepção de
educação relacionada com a invenção da cultura; e a cultura é,
sobretudo, o território privilegiado dos significados. Sem uma
interpretação do mundo, não podemos entendê-lo. A interpretação é uma
leitura do pensar, do agir e do sentir dos homens e das mulheres. Ela é
múltipla e revela que a cultura é uma abertura para o infinito, e o
próprio "homem é uma metáfora de si mesmo". A capacidade de interpretar o
mundo amplia-se com a criação contínua de linguagens e a possibilidade
crescente de socializá-las, mas não pode deixar de contemplar a relação
entre as pessoas e o meio ambiente, medida pelo trabalho, espaço
fundamental de geração de cultura.
Ora, a instituição de uma Base Nacional Comum com uma Parte
Diversificada, a partir da LDB, supõe um novo paradigma curricular que
articule a Educação Fundamental com a Vida Cidadã.
O significado que atribuímos à Vida Cidadã é o do exercício de
direitos e deveres de pessoas, grupos e instituições na sociedade, que
em sinergia, em movimento cheio de energias que se trocam e se
articulam, influem sobre múltiplos aspectos, podendo assim viver bem e
transformar a convivência para melhor.
Assim as escolas com suas propostas pedagógicas, estarão
contribuindo para um projeto de nação, em que aspectos da Vida Cidadã,
expressando as questões relacionadas com a Saúde, a Sexualidade, a Vida
Familiar e Social, o Meio Ambiente, o Trabalho, a Ciência e a
Tecnologia, a Cultura e as Linguagens, se articulem com os conteúdos
mínimos das Áreas de Conhecimento.
Menção especial deve ser feita à Educação Infantil, definida nos
arts. 29 a 31 da LDB que, dentro de suas especificidades, deverá merecer
dos sistemas de ensino as mesmas atenções que a Educação Fundamental,
no que diz respeito às Diretrizes Curriculares Nacionais. A importância
desta etapa da vida humana, ao ser consagrada na LDB, afirmando os
direitos das crianças de 0 aos 6 anos, suas famílias e educadores, em
creches e classes de educação infantil, deve ser acolhida pelos sistemas
de ensino dentro das perspectivas propostas pelas DCN, com as devidas
adequações aos contextos a que se destinam.
Recomendação análoga é feita em relação à Educação Especial,
definida e regida pelos arts. 58 a 60 da LDB, que inequivocamente,
consagram os direitos dos portadores de necessidades especiais de
educação, suas famílias e professores. As DCN dirigem-se também a eles
que, em seus diversos contextos educacionais, deverão ser regidos por
seus princípios.
Assim, respeitadas as características regionais e locais da
sociedade, da cultura, da economia e da população servida pelas escolas,
todos os alunos terão direito de acesso aos mesmos conteúdos de
aprendizagem, a partir de paradigma curricular apresentado dentro de
contextos educacionais diversos e específicos. Esta é uma das diretrizes
fundamentais da Educação Nacional.
Dentro do que foi proposto, três observações são especialmente importantes:
a) A busca de definição, nas propostas pedagógicas das escolas,
dos conceitos específicos para cada área de conhecimento, sem desprezar a
interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade entre as várias áreas.
Neste sentido, as propostas curriculares dos sistemas e das escolas
devem articular fundamentos teóricos que embasem a relação entre
conhecimentos e valores voltados para uma vida cidadã, em que, como
prescrito pela LDB, o ensino fundamental esteja voltado para o
desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o
pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo; compreensão do
ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes
e dos valores em que se fundamenta a sociedade, desenvolvimento da
capacidade de aprendizagem, fortalecimento dos vínculos de família, dos
laços de solidariedade humana e de tolerância.
Os sistemas de ensino, ao decidir, de maneira autônoma, como
organizar e desenvolver a Parte Diversificada de suas propostas
pedagógicas, têm uma oportunidade magnífica de tornarem contextualizadas
e próximas, experiências educacionais consideradas essenciais para seus
alunos.
b) A compreensão de que propostas curriculares das escolas e dos
sistemas, e das propostas pedagógicas das escolas, devem integrar bases
teóricas que favoreçam a organização dos conteúdos do paradigma
curricular da Base Nacional Comum e sua Parte Diversificada: Tudo,
visando ser conseqüente no planejamento, desenvolvimento e avaliação das
práticas pedagógicas. Quaisquer que sejam as orientações em relação a
organização dos sistemas por séries, ciclos, ou calendários específicos,
é absolutamente necessário ter claro que o processo de ensinar e
aprender só terá êxito quando os objetivos das intenções educacionais
abrangerem estes requisitos.
Assim, para elaborar suas propostas pedagógicas, as Escolas devem
examinar, para posterior escolha, os Parâmetros Curriculares Nacionais e
as Propostas Curriculares de seus Estados e Municípios, buscando
definir com clareza a finalidade de seu trabalho, para a variedade de
alunos presentes em suas salas de aula. Tópicos regionais e locais muito
enriquecerão suas propostas, incluídos na Parte Diversificada, mas
integrando-se à Base Nacional Comum.
c) A cautela em não adotar apenas uma visão teórico-metodológica
como a única resposta para todas as questões pedagógicas. Os professores
precisam de um aprofundamento continuado e de uma atualização constante
em relação às diferentes orientações originárias da Psicologia,
Antropologia, Sociologia, Psico e Sócio-Linguística e outras Ciências
Humanas, Sociais e Exatas para evitar os modismos educacionais, suas
frustrações e resultados falaciosos.
O aperfeiçoamento constante dos docentes e a garantia de sua
autonomia, ao conceber e transformar as propostas pedagógicas de cada
escola, é que permitirão a melhoria na qualidade do processo de ensino
da Base Nacional Comum e sua Parte Diversificada.
V - As escolas deverão explicitar, em suas propostas curriculares,
processos de ensino voltados para as relações com sua comunidade local,
regional e planetária, visando à interação entre a Educação Fundamental e
a Vida Cidadã; os alunos, ao aprender os conhecimentos e valores da
Base Nacional Comum e da Parte Diversificada, estarão
também constituindo suas identidades como cidadãos em
processo, capazes de ser protagonistas de ações
responsáveis, solidárias e autônomas em relação a si
próprios, às suas famílias e às comunidades.
Um dos mais graves problemas da educação em nosso país é sua
distância em relação à vida e a processos sociais transformadores. Um
excessivo academicismo e um anacronismo em relação às transformações
existentes no Brasil e no resto do mundo, de um modo geral, condenaram a
Educação Fundamental, nestas últimas décadas, a um arcaísmo que
deprecia a inteligência e a capacidade de alunos e professores e as
características específicas de suas comunidades. Esta diretriz prevê a
responsabilidade dos sistemas educacionais e das unidades escolares em
relação a uma necessária atualização de conhecimentos e valores, dentro
de uma perspectiva crítica, responsável e contextualizada. Esta diretriz
está em consonância especialmente com o Art. 27 da LDB.
Desta forma, através de possíveis projetos educacionais regionais
dos sistemas de ensino, através de cada unidade escolar, transformam-se
as Diretrizes Curriculares Nacionais em currículos específicos e
propostas pedagógicas das escolas.
VI - As escolas utilizarão a Parte Diversificada de suas
propostas curriculares, para enriquecer e complementar a Base Nacional
Comum, propiciando, de maneira específica, a introdução de projetos e
atividades do interesse de suas comunidades (arts. 12 e 13 da LDB)
Uma auspiciosa inovação introduzida pela LDB refere-se ao uso de
uma Parte Diversificada a ser utilizada pelas escolas no desenvolvimento
de atividades e projetos, que as interessem especificamente.
É evidente, no entanto, que as decisões sobre a utilização desse
tempo, se façam pelas equipe pedagógica das escolas e das Secretarias de
educação, em conexão com o paradigma curricular que orienta a Base
Nacional Comum.
Assim, projetos de pesquisa sobre ecossistemas regionais, por
exemplo, ou atividades artísticas e de trabalho, novas linguagens (como
da informática, da televisão e de vídeo) podem oferecer ricas
oportunidades de ampliar e aprofundar os conhecimentos e valores
presentes na Base Nacional Comum.
VII - As Escolas devem, através de suas propostas pedagógicas e de
seus regimentos, em clima de cooperação, proporcionar condições de
funcionamento das estratégias educacionais, do espaço físico, do
horário e do calendário escolar, que possibilitem a
adoção, a execução, a avaliação e o aperfeiçoamento das
demais Diretrizes, conforme o exposto na LDB arts 12 a 14.
Para que todas as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Fundamental sejam realizadas com êxito, são indispensáveis o espírito de
equipe e as condições básicas para planejar os usos de espaço e tempo
escolar.
Assim, desde a discussão e as ações correlatas sobre
interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, decisões sobre sistema
seriado ou por ciclos, interação entre diferentes segmentos no exercício
da Base Nacional Comum e Parte Diversificada, até a relação com o
bairro, a comunidade, o estado, o país, a nação e outros países, serão
objeto de um planejamento e de uma avaliação constantes da Escola e de
sua proposta pedagógica.
II - VOTO DA RELATORA
Á luz das considerações anteriores, a Relatora vota no sentido de
que este conjunto de Diretrizes Curriculares Nacionais norteiem os rumos
da Educação Brasileira, garantindo direitos e deveres básicos de
cidadania, conquistados através da Educação Fundamental e consagrados
naquilo que é primordial e essencial: aprender com êxito, o que
propicia a inclusão numa vida de participação e transformação nacional,
dentro de um contexto de justiça social, equilíbrio e felicidade.
Brasília-DF, 29 de janeiro de 1998.
Conselheira Regina Alcântara de Assis - Relatora
III - DECISÃO DA CÂMARA
A Câmara de Educação Básica acompanha o Voto da Relatora.
Sala das Sessões, 29 de janeiro de 1998
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